Família Completa

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Familia em 27 de dezembro de 2009

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segunda-feira, 5 de abril de 2010

CARNE DE SOL

CARNE DE SOL

Avenor Augusto Montandon

Eu estava muito cansado e faminto. Tinha trabalhado muito durante todo o dia depois de viajar do Rio para Recife no dia anterior e passado todo o dia treinando o um monte de gente no novo sistema que estava implantando no Brasil todo. Eram 5 horas da tarde e estava previsto que encerraria a cansativa jornada as seis da tarde.
O Cavalcante bateu na porta do auditório, pediu licença, e cochichou no meu ouvido:
- O Dr. Aloizio quer falar com você. Disse que é importante. Atenda ao telefone no meu gabinete no andar de baixo. Vamos lá!
Fiquei contrariado por interromper o meu trabalho, pois pretendia concluir ainda naquela tarde todo o conteúdo proposto, descansar e embarcar no dia seguinte bem cedo para Maceió onde faria, naquela aprazível cidade alagoana, o mesmo que estava fazendo em Recife. Era o responsável por implantar um sistema que passaria a controlar o pagamento de todos os hospitais brasileiros. Como um dos diretores do INAMPS, eu tinha um cronograma rígido a cumprir nesse trabalho e seriam muitas as capitais que teria que visitar em pouco tempo.
Pedi licença para os atentos participantes, e acompanhei o superintendente do INAMPS de Pernambuco ao seu gabinete.
- Pois não Dr. Aloizio, atendi.
- Montandon, eu estou aqui em Natal e queria conversar pessoalmente com você hoje!
- Dr. Aloizio, eu estou em Recife, ocupadíssimo, ainda não terminei a minha meta de hoje e pretendo estar amanhã cedo em Maceió!
- Cancela a viagem de Maceió em vem pra cá hoje!
- Como farei isso, presidente? Nem sei se tem avião pra Natal hoje!
- Ora, o Cavalcante dá um jeito de te trazer aqui. O Beltrão vai estar aqui amanhã e preciso estar com você antes de encontrar com o Ministro!
Pela insistência do presidente do INAMPS, de quem eu era subordinado, julguei que teria que contrariar minha programação e ir ao seu encontro. O Cavalcante, que ouvia a conversa ao lado, tentou me tranqüilizar: - Preocupa não doutor, daqui lá é perto. Te levo no carro do Instituto!
- Perto? Daqui até Natal é perto?
- É, quer dizer, a estrada é boa, o carro é confortável e até lá pelas 11 da noite a gente ta lá –
- Mas Cavalcante nos temos que atravessar o estado da Paraíba!
- Não é longe não. A gente chega lá.
Contrariado com a imprevisível interrupção do meu programa, voltei ao auditório, encerrei as atividades, e me despedi da turma de umas 60 pessoas que tinham estado comigo em treinamento nos últimos três dias. Eram todos empregados de hospitais da capital e interior.
Voltei ao gabinete do Cavalcante que interrompeu uma ligação para me pedir que fosse ao hotel pegar minhas coisas e o aguardasse lá.
-Montandon, no máximo às 18 horas te pego no hotel!
Pontualmente a perua Chevrolet Veraneio preta parou na porta. Eu me acomodei sozinho no banco de trás e o superintendente com o motorista assentados na frente.
- Cavalcante, eu tô morrendo de fome! Almocei meio dia e até agora não comi nada!
- Não se preocupe, logo na frente tem um restaurante muito bom e a gente pára pra comer.
Chegamos em Natal eram mais de onze horas da noite. Estava cansadíssimo e mesmo assim fomos diretos para o hotel onde estava hospedado o Dr. Aluizio. Por sorte no mesmo hotel nos hospedamos.
Movido pela curiosidade, pouco me detive no meu quarto. Dei uma ajeitada no visual e subi para o apartamento do chefe que me aguardava. O velho, pálido e magro, assentado na cama, de longe parecia o ícone que todos reverenciávamos. Famoso por ser o médico do ex presidente Juscelino, membro da Academia Brasileira de Medicina, vestido num pijama modesto, coçando os dedos dos pés, conversava entusiasticamente com um jovem deputado nordestino, que sorvia goles de um whisky 12 anos, num confortável sofá à sua frente.
- Senta aí Montandon. Prazer em te ver. Fizeram boa viagem?
- Sim presidente, obrigado.
- Esse é o meu amigo deputado fulano de tal.
A conversa se prolongou pela madrugada a fora. Não fosse tão agradável e regrada a tragos “on the rocks” teria sido vencido pelo cansaço.
Falamos sobre tudo, de política a turismo; finanças e medicina. Procurei insistentemente descobrir as razões da minha intempestiva convocação e só no momento em que me despedi, eu consegui arrancar do chefe uma razão, pouco convincente para aquela inesperada viagem.
Já visivelmente abatido pelos vários tragos, simplesmente me disse:
- Queria conversar com você!
Fiquei sem saber exatamente até hoje porque tinha feito aquela viagem...
Ah! Eu nunca mais me esqueci! Na viagem de mais de quatro horas, varado de fome e sede no calor das noites nordestinas, nove horas da noite, mais de três de viagem, foi quando paramos num simples restaurante no interior da Paraíba, aquele tal restaurante ao qual o Cavalcante havia se referido. Foi ali que comi a melhor e inesquecível carne de sol da minha vida, regrada a uma cerveja geladíssima!
Teria sido a fome que a tornou tão saborosa?

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